Organizado e implementado pelos Estados Unidos a partir de 1942, o Projeto Manhattan buscava explorar o processo de fissão nuclear para fins militares - algo além dos conhecimentos daquele tempo. Essa época coincide com a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial, quando foi testada - em 1945 - a primeira bomba atômica do mundo.
Foram, como bem nos lembra a história, dois artefatos: um em Hiroshima e outro em Nagasaki, no Japão. O uso das primeiras bombas atômicas, já no final do Segundo Conflito Mundial, certamente catalisou a rendição japonesa, mas - por outro lado - iniciou um cenário global de corrida armamentista e instabilidade num início de Guerra Fria.
De um lado, o uso da obra de Oppenheimer reforçou a confiança norte-americana, seja em reuniões subsequentes ao pós-guerra seja em termos políticos globais, tornando os EUA ainda mais determinados a obter compromissos do governo soviético. Para os norte-americanos, o monopólio sobre a bomba atômica ameaçaria a segurança da URSS, limitando suas opções e gerando uma vantagem desproporcional para Washington, em comparação à força convencional do Exército Vermelho na Europa. Com uma bomba atômica, os EUA poderiam assegurar a reconstrução econômica da Europa - arrasada pela Segunda Guerra Mundial - sem urgência em corresponder às capacidades militares soviéticas.
A posse de artefatos nucleares pelos Estados Unidos impactou a Europa Ocidental, ao passo que garantiu aos europeus maior segurança por estarem sob o “guarda-chuva nuclear” americano. Isso fez com que os europeus não necessitassem firmar acordos externos com a União Soviética.
Mas a inspiração e confiança norte-americana por conta da posse de artefatos nucleares após a Guerra Fria não perdurou, e, em 1949, a União Soviética explodiu com sucesso sua primeira bomba atômica. Na sequência, a tecnologia foi replicada pelo Reino Unido em 1952, pela França em 1960 e pela China em 1964. Dessa forma, logo em 1962, os soviéticos implantaram mísseis nucleares em Cuba, para tentar forçar concessões dos EUA na Europa, gerando outro caso de diplomacia atômica - ato de uso ou a ameaça de guerra nuclear. Durante a Guerra Fria, inúmeras foram as ocasiões em que uma forma de diplomacia atômica foi empregada tanto pelos EUA quanto pela URSS.
Em nossos dias, o receio de uma escalada nuclear na atual Guerra da Ucrânia é um herança deixada por esse período da Guerra Fria. Primeiro, pois muitos apontam que o atual conflito trata-se de um embate indireto entre a OTAN e a Rússia; haja vista o envio de armamentos, equipamentos militares e suprimentos para os ucranianos. De outro, EUA e União Europeia não atacariam diretamente a Rússia, temendo o uso de armas atômicas por Moscou.
Aqui, há um jogo de interesses; uma “dança” diplomática na qual a mera suspeita de agressão leva a intensas tensões internacionais. O que vivemos hoje é um caso emblemático do dilema da segurança nas relações internacionais, em que Estados preocupados com sua preservação buscam adquirir meios para garanti-la. Para isso, incrementam-se capacidades militares, o que gera novas ondas de corridas armamentistas. No fim, aumenta a insegurança do sistema como um todo. Considerando que, atualmente, a Polônia vem se armando fortemente, isso é - em alguma medida - o que a Europa presenciou hoje.
Enquanto inicialmente as armas nucleares e seus vários meios de lançamento existem pelas necessidades impulsionadas pelas inseguranças humanas, o real litígio nessa esfera é a busca duradoura por uma segurança que se manifesta na luta por projeção e influência. O que presenciamos na atual política global é um cenário em que algo do comportamento dos Estados continua sendo produto de intensa competição.
Que as semelhanças com o passado terminem por aqui, ou a próxima barreira a ser rompida será efetivamente o uso da força nuclear entre potências.
*João Alfredo Lopes Nyegray é doutor e mestre em Internacionalização e Estratégia. Especialista em Negócios Internacionais. Advogado, graduado em Relações Internacionais. Coordenador do curso de Comércio Exterior e do Observatório Global da Universidade Positivo (UP). Instagram: @janyegray
*Luis Carlos Dal’Toè Geittenes é internacionalista, egresso do curso e do Observatório Global de Relações Internacionais da Universidade Positivo (UP).